Rubens Alves, minhas crônicas por suas crônicas
Anos atrás por acaso ou predestinação (nesse contexto, lembro-me de Santo Agostinho), conheci o Rubens Alves, não literalmente em carne e osso, mas o conheci. Conheci sua vida, seus filhos, amigos e seu pensar. E quando isso aconteceu, conheci um pouco mais de mim.
Essa predestinação do conhecer-te, só foi possível, quando minha irmã encontrou um livro de crônicas no banco do metrô de São Paulo. Trazendo-o a mim, me presenteou, assumo que de início não falei com Alves (hoje ele é um amigo e de alguma forma me ajudou até aqui, por isso tomo a liberdade de chama-lo de Alves). Estava naquele período conversando muito com Nietzsche, Drummond e Guimarães, além de ouvir os sábios ensinamentos de Chiavenato para as organizações.
Belo dia, ouvi sua voz a me chamar, sentei em minha sala para encontrar essa voz entre os livros. Espalhei todos no chão e fui procurar aquele que desejava falar comigo. Quando ali vi a bendita coleção de crônicas do Alves. Ainda no chão com minha xícara de café, li sua apresentação e o conheci de fato.
Um pastor filósofo que não caminhava nos padrões dogmáticos de um sistema monoteísta. Mas reconhecia de uma forma sábia a existência falha dos sapiens e como o grande tapeceiro tecia e sua obra artesã.
Estupefato com a primeira crônica, parti logo pra segunda, terceira... enfim, entrei nas particularidades do escritor, vi sua nudez camuflada pela gramática. Foi me fascinando e vi num ser, outro igual a mim. Não digo isso pelos feitos e conhecimento (apesar de desejar muito) mas pela verdade compartilhada e ausência do medo de recriar um demônio em um ser que compreende o sagrado.
Quando terminei o livro, fiquei irritado, não desejaria que este acabasse. Mas entendi que era necessário. Embora os dias terem passados, não esqueci das palavras, pois muitas me fizeram ri, refltir e compreender o que já vivi.
Busquei conhecê-lo mais, foi quando tive acesso a outras obras, pensamentos e palestras. Todas banhadas de humanidade e conhecimento.
Passados um bom tempo, mergulhei na vida de escritor, na procura de me desconectar da Matrix. De início tinha somente pensamentos escritos em cadernos no tempo de colegial. Quando os reencontrei, vi um Eu parecido com Alves, alma inquieta e pensamentos loucos. Li todos, e depois joguei fora, decidi refazer minhas palavras em novas histórias.
Quando resolvi escrever "Deus está morto!", dialogando com o bigodudo Nietzsche, que a propósito é um ser que também falou muito com Alves, decidi compartilhar com um amigo, mas não falei do autor. Desejava capturar sua reação. E para meu espanto, ele ficou abismado com a crônica, logo perguntou quem havia escrito. Falei num tom de brincadeira (pois temos essa liberdade), eu o filósofo! Ouvi uma resposta sincera no qual eu deveria compartilhar o texto, pois era muito bom.
Nessa altura do campeonato, havia eu feito outros textos e iniciei os poemas. Pois os primeiros escritos não tinham estruturas, havia apenas minhas "verdades". Em cada pensamento fui compreendendo como poderia me expôr, materializar as leviandades que sempre me cercaram, ficar nu em minha gramática. Nisso a vontade de compartilhar os pensamentos foi surgindo a medida que meus amigos tinham contato com os texto.
Em 31 de dezembro de 2018 (data da primeira publicação de um escrito), entre uma conversa internacional, com minha grande amiga colombiana Julliana, fui convencido a assumir que os textos fazem parte de quem sou e, o que sou é o reflexo daqueles que foram e me ensinaram. Entre todos, Alves é o cara que me ilustrou os caminhos das crônicas, ensinou-me como fazer, e espero conseguir faze-lo com tamanha maestria, humanidade e conhecimento.
Sempre que escrevo uma crônica, tenho em mente o Alves e, após esses meses, entendo o que aconteceu comigo. E só entendi, porque outros leitores me ensinaram a enxergar o que enxergo em Alves. Uma verdade escrita por um poeta, pode ser uma verdade lida por uma outra pessoa, as palavras podem sair de um e fazer sentido em outro.
Tudo pode acontecer quando se escreve, os leitores se alimentam da imaginação do autor, para expressar o que sempre estiveram em suas almas. Os leitores usam as palavras como ponte para outros mundos, ou para compreender suas realidades e se identificar com a essência desse autor.
Minhas "verdades", isto é! aquilo que nós escritores pensamos como diretrizes do que vivemos, buscamos e idealizamos. Não é uma verdade comum, tão pouco, será um ponto de vista compreensível para todos. Pois não escrevemos nossas verdades como pilares absolutos, mas como brisas passageiras, que um simples bufar da vida desfaz e refaz.
Essa identificação só é possível porque houve o compartilhar ... Um dia Rubens Alves compartilhou e eu recebi, hoje eu compartilho e você recebe.
Wellingtton Jorge
Comentários
Postar um comentário