Céu de Bronze
Tenho mudado numa velocidade que não consigo me reconhecer. Não digo na aparência, embora essa também sofre a metamorfose do tempo. Isso não me assusta! é de se esperar que o tempo como o vento leve as folhas secas que outrora eram juventude que a vida me deu.
Não quero aqui prender-me no que tange o poderio do tempo, mas se me cabe a capacidade, em crônica falarei sobre a mudança que poucos veem. E esse texto só nascerá por recentemente ter lido o famoso livro "Bagagem" de Adélia Prado e, iniciar minha escavação nerdiana sobre a vida da autora.
Como de costume se uma obra me chama atenção, jogo-me do penhasco da curiosidade e deixo minha alma e o intelecto devorar tudo que posso, no tempo que posso, com a capacidade que tenho (algumas vezes sinto que ambos possuem um metabolismo acelerado, a fome sempre chega).
Com isso me deparei com a Adélia narrando sua fase de escuridão espiritual, do assombro que é existir. Deixo claro que já conhecia a poesia e admirava, mas assim como a lua que sempre vemos e não paramos para olhar, fui míope intelectual e, só quando a trouxe para perto que vi o óbvio.
Me vi Adélia, sua escuridão a minha, seu assombro o meu, havia um desconhecido gritando usando as roubas de minha pele. Se passando por mim entre todos, afirmando o que eu não acreditava, negando o que eu compreendia como certo. Sentia-me sofista contornando as verdades com leves palavras falsas. Das terras firmes que pisava no passado, continuam lá, embora eu sinta areia movediça entre os dedos dos pés.
Passou-se dias, implorei por lágrimas. Queria ter a alegria de poder chorar tristeza, sentir a lágrima salgada contornar minha face. Em vão o desejo! Choro de verdade não se cria, vem a nós naturalmente, sem percebermos (era este choro que eu implorava).
Olhei para Deus sem o ver (claro, não há como ver Deus!), pela primeira vez entendi profundamente o que em suas escrituras narrava ao dizer da existência de um céu de bronze. Por ele nenhuma palavra passa, como um quarto de isolamento acústico, Deus não ouve o que meninos gritam aqui na terra.
Isso não me fez descrer em Deus, mas no íntimo também criei meu céu de bronze. E nesse isolamento nada da tua obra como mandamento chegou até mim, muito menos saiu de mim. Mas saibam que Deus não tem nada a ver com isso! Das questões humanas, os humanos devem lidar, com as questões metafísicas somente Deus há de cuidar.
Não me ficou claro quando a Adélia saiu da escuridão, ou se na escuridão ela somente abriu os olhos e contemplou a luz. Também não sei se isso vem de Adélia ou de mim, pois essa é a primeira crônica que escrevo de forma inacabada, sem um desfecho ou ponto final. Para você que a lê, poderá soar como misteriosa, para mim soa como vida...
Wellingtton Jorge
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